PARA NÃO ME PERDER NO DISCURSO DO OUTRO, DO PRÓXIMO, TENTO ENCONTRAR O MEU.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

"Para compreendermos o valor da âncora, necessitamos enfrentar uma tempestade." (Eleonor L. Dolan)

Carrego comigo uma enorme dificuldade de desprendimento de todos os sentimentos e carinhos que um dia foram materializados, sempre foi assim... difícil jogar na lata do lixo a velha agenda de telefones, o caderno inutilizável quando cursava o ensino infantil, a caneta que acabou a tinta, mas que está associada ao presente um dia ganhado... cresci, e até hoje mantenho numa caixinha, as cartas, os bilhetes, os cartões comemorativos, enfim, lembranças doces e amargas da construção de uma vida. Tenho todos os presentes, as cartas partilhadas, os e-mails recebidos. Às vezes sentado no meu quarto, revejo tudo isso e reencontro sorrisos, palavras, promessas... não se trata de fuga, nem de desejos, não sinto alegria eufórica, nem dor ou sofrimento, mas reconheço que preenche de certa forma, vazios... Confesso que gostaria de ser bem menos: menos nostálgico, menos exigente comigo mesmo, com os sentimentos, com a teimosia, com os afetos. Mas, como diria Florbela: “O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais; há em mim uma sede de infinito...”. Sempre acreditei na reconstrução, e muitas vezes, construindo pensamentos, recorri numa espécie de subterfúgio ou esperança a temática sugestiva, mas a verdade é que nunca consegui reconstruí amores ou sentimentos... já tentei encontrar outras formas, novos jeitos e olhares diante das pessoas que marcaram de uma forma singular a minha vida, mas não mais as reencontro, porque além do corpo matéria, minha alma é enigma, é mistério, que aliados aos meus conceitos de um eterno romântico são contraditórios diante da atitude e da forma. Ser romântico é ser preso e livre, é entender uma dimensão de entrega, de busca, de ousadia, coragem e principalmente de transparência. É guerrear, lutar com todas as forças por algo ou alguém movido pela crença do amor. É marcar no instante, ratificar o carinho através da música, da palavra, da poesia. É despojar-se dos segredos, é ser, é ter (cor)ação!... já me disseram: “o teu problema reside na necessidade de retorno imediato”, “você é muito pegajoso”... são fragmentos que denotam meu jeito de amar. Affonso Romeno de Sant’anna no poema o amor e o outro afirmava: “não amo melhor, nem pior que ninguém / do meu jeito amo. Ora esquisito, ora fogoso, às vezes aflito ou ensandecido de gozo. Já amei até com nojo /...” E é exatamente assim, eximido de receios e medos que te busco incansavelmente, e quando é chegado o momento de sair de cena, fechar as cortinas e partir, me vem na lembrança versos de Quintana: “Amar é mudar a alma de casa”, e quando tudo escancara para o fim, estou em busca de uma nova morada, encontrando em Machado a explicação reflexiva do final: “esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em o que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito”. Daí o quanto é perceptível que para mim, reconstruir é impossível, que embora carregando aquela caixinha de carinhos materializados, há a escassez de essência. Tudo foi consumido, extinguiu-se – pereceu! (HODIE)

Um comentário:

Anônimo disse...

Hodie, tirando a coisa de dificuldade de desprendimento, que não combina muito comigo, porque eu de verdade sou muito desprendida, me indentifiquei com as demais idéias desse texto que está genial! Parabéns Hodie.
Bjs Pulcra